DESTAQUEEDITORIAL

Depois da COP30, a Amazônia deixa o discurso e passa a cobrar compromissos

Por Dora Tupinambá (*)

A COP30 terminou em Belém sob aplausos, promessas e discursos históricos. A Amazônia, pela primeira vez, ocupou o centro do palco climático global não apenas como problema, mas como solução. Chefes de Estado, investidores e organismos internacionais apontaram para a floresta como eixo estratégico da agenda climática do planeta. Passado o evento, porém, o que se impõe agora é uma pergunta incômoda e inevitável: o que, de fato, começou a mudar nos territórios amazônicos?

O pós-COP30 revela um cenário menos épico e mais real. Há avanços, sim — mas também um descompasso evidente entre o volume de promessas anunciadas e a capacidade concreta de execução dos estados da Amazônia Legal. O discurso amadureceu mais rápido do que as estruturas públicas responsáveis por transformá-lo em política efetiva.

Nos estados amazônicos, a realidade é desigual. O Pará, vitrine da conferência, apresenta números positivos na redução do desmatamento e ampliou sua capacidade de captação de recursos. Ainda assim, enfrenta o desafio clássico da Amazônia: transformar anúncios em contratos, projetos em obras e compromissos internacionais em ações permanentes. Ser sede da COP30 trouxe prestígio — e trouxe cobrança.

O Amazonas vive outra contradição. Sediando um dos maiores polos industriais do país, com faturamento anual superior a R$ 200 bilhões, o estado ainda destina uma fração mínima de seu orçamento à política ambiental estruturante. A pauta climática avança no discurso, mas segue periférica na estratégia econômica. A floresta continua sendo tratada mais como ativo simbólico do que como eixo real de desenvolvimento.

No Amapá, onde grande parte do território permanece preservada e sob regime de proteção ambiental, o paradoxo é outro: a floresta está em pé, mas o Estado ainda carece de musculatura institucional para transformar conservação em desenvolvimento sustentável. Com orçamento limitado e baixa capacidade técnica para estruturar projetos de escala, o Amapá corre o risco de permanecer como vitrine ecológica sem acesso proporcional aos recursos climáticos anunciados no pós-COP30.

No Acre, o capital ambiental é imenso, mas o capital financeiro é escasso. O estado mantém um discurso ambiental coerente há anos, mas segue limitado por orçamento restrito, dependência federal e baixa capacidade de escalar projetos. O interesse internacional existe — o gargalo está dentro de casa.

Rondônia e Roraima expõem tensões ainda mais profundas. Em Rondônia, o crescimento econômico impulsionado pelo agronegócio segue pressionando áreas sensíveis, enquanto a política ambiental permanece reativa. Em Roraima, a crise migratória, os conflitos fundiários e a fragilidade institucional reduzem drasticamente a capacidade de acessar e executar recursos climáticos.

O Tocantins, por sua vez, aposta na logística e na agroindústria, mantendo a agenda ambiental em posição secundária. Tem potencial de transição, mas ainda não apresentou um projeto climático consistente que dialogue com o novo cenário pós-COP30.

O saldo, portanto, é claro: a Amazônia ganhou centralidade política, mas ainda não ganhou musculatura institucional à altura das expectativas criadas. A COP30 elevou o patamar do debate. Agora, elevou também o nível da cobrança.

O tempo das promessas se encerrou em Belém. O pós-COP30 inaugura uma fase mais dura e menos tolerante a discursos vazios. A régua agora é execução, orçamento, contratos, cadeias produtivas estruturadas e redução efetiva da pressão ambiental.

A Amazônia deixou de ser apenas pauta. Tornou-se teste.

E, a partir de agora, será julgada não pelo que promete, mas pelo que entrega.

(*) jornalista amazônida, fundadora do Portal Valor Amazônico

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pular para o conteúdo