Após 21 dias, caso Benício revela falhas e amplia cerco judicial em Manaus
Justiça revoga habeas corpus de médica, nega pedido de técnica de enfermagem e amplia investigação para apurar responsabilidades do Hospital Santa Júlia na morte do menino de 6 anos
Vinte e um dias após a morte do menino Benício Xavier Freitas, de apenas 6 anos, em Manaus, o caso deixou definitivamente de ser tratado como um possível erro individual e passou a revelar um quadro mais amplo e preocupante de falhas na assistência médica. A Justiça do Amazonas revogou a liminar que garantia à médica investigada acompanhar o processo em liberdade, endurecendo a resposta institucional e ampliando o cerco judicial sobre os envolvidos.
A decisão marca uma virada na condução do processo e reforça a leitura de que o episódio extrapola a esfera médica individual, alcançando protocolos, rotinas e responsabilidades institucionais do próprio hospital onde a criança foi atendida.
Liminar cassada e novo cenário jurídico
A médica Juliana Brasil Santos, responsável pelo atendimento inicial da criança no Hospital Santa Júlia, havia obtido habeas corpus em regime de plantão, o que lhe assegurava liberdade provisória. No entanto, a Justiça cassou a liminar, entendendo que a medida não era adequada diante da gravidade dos fatos e da fase em que se encontra a investigação.
Com a revogação, a situação jurídica da médica volta a ser analisada no curso regular do processo, sem a blindagem concedida inicialmente. A decisão sinaliza maior rigor do Judiciário e reforça a seriedade com que o caso vem sendo tratado.
Técnica de enfermagem tem habeas corpus negado
A técnica de enfermagem Raiza Bentes Paiva, responsável pela aplicação da adrenalina por via intravenosa, também buscou habeas corpus preventivo, mas teve o pedido negado pelo Tribunal de Justiça do Amazonas.
Na decisão, o magistrado destacou que, embora a prescrição médica seja objeto de investigação, a execução do procedimento — especialmente a via de administração e a dosagem aplicada — possui gravidade suficiente para justificar medidas cautelares mais rígidas.
Além da negativa judicial, a técnica teve o exercício profissional suspenso pelo Conselho Regional de Enfermagem do Amazonas (Coren-AM), reforçando o caráter administrativo e ético da apuração.
Hospital entra formalmente no radar das investigações
Vinte e um dias após a morte da criança, a apuração do caso não se restringe às duas profissionais. O Hospital Santa Júlia passou a ser alvo direto da investigação, que busca identificar falhas sistêmicas, ausência ou descumprimento de protocolos e possíveis erros no atendimento de emergência.
A investigação é conduzida pela Polícia Civil do Amazonas, por meio do 24º Distrito Integrado de Polícia (DIP), com acompanhamento do Ministério Público do Amazonas (MP-AM). Entre as linhas de apuração estão:
a prescrição e a indicação da adrenalina;
a checagem da dose e da via de administração;
a atuação da equipe de enfermagem;
eventuais falhas no procedimento de intubação;
e a responsabilidade institucional do hospital quanto aos protocolos de segurança do paciente.
Perícias, depoimentos e análise de prontuários integram o conjunto de diligências em curso.
Do atendimento simples à tragédia
Benício deu entrada no hospital com sintomas considerados leves, como tosse e suspeita de infecção respiratória. Após a aplicação da medicação, a criança apresentou piora súbita, sofreu múltiplas paradas cardiorrespiratórias e não resistiu.
Para a família, o que deveria ser um atendimento de rotina se transformou em uma tragédia irreversível. O caso provocou comoção pública, protestos em frente à unidade hospitalar e pressão crescente por responsabilização.
Caso reacende debate sobre segurança do paciente
A morte de Benício reacende um debate sensível e urgente: a segurança do paciente, especialmente na rede privada de saúde. Especialistas apontam que erros de medicação figuram entre as principais causas evitáveis de eventos adversos graves, e que protocolos rígidos existem justamente para impedir falhas humanas em situações de emergência.
O endurecimento das decisões judiciais indica que o caso pode se tornar um marco local na responsabilização por falhas médicas e institucionais.
Justiça, agora, sob escrutínio público
Com a liminar cassada, habeas corpus negado e o hospital formalmente investigado, o caso Benício entra em uma nova fase. A expectativa da família e da sociedade é de que a apuração avance com transparência, rigor técnico e responsabilização proporcional aos fatos.
A tragédia deixou de ser apenas uma dor privada. Vinte e um dias depois, tornou-se um teste para o sistema de saúde, para os órgãos de fiscalização e para o próprio Judiciário do Amazonas.
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