Pulmões sob pressão no Amazonas
No Dia Mundial do Pulmão, internações e mortes por doenças crônicas respiratórias expõem desafio de saúde pública; especialistas alertam para diagnóstico precoce e prevenção
Respirar deveria ser o gesto mais simples e natural da vida, mas para milhares de amazonenses tem se tornado um desafio diário. Entre 2020 e 2024, o estado registrou mais de 4 mil internações no SUS por Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC, que inclui enfisema e bronquite crônica) e quase 1,7 mil mortes, com taxa de mortalidade hospitalar em torno de 40%. Os números revelam a dimensão de uma doença silenciosa, que fragiliza famílias, afeta o mercado de trabalho e pressiona o sistema público de saúde.
Cada internação significa afastamento do trabalho, despesas extras e reorganização da rotina familiar. Com mortalidade hospitalar elevada, a DPOC não apenas ameaça a saúde individual, mas mina a produtividade e o equilíbrio financeiro de muitas famílias. O SUS, por sua vez, absorve custos elevados com internações prolongadas e medicamentos de uso contínuo, evidenciando a urgência de políticas preventivas.
Fumo, poluição e diagnóstico tardio
Embora Manaus registre apenas 4,8% de fumantes adultos, o menor índice entre capitais brasileiras, o tabagismo continua sendo o principal fator associado às doenças respiratórias crônicas. Na Amazônia, soma-se ainda a poluição provocada pelas queimadas, que degrada a qualidade do ar e multiplica internações em períodos críticos.
Estudos nacionais estimam que 7 milhões de brasileiros convivem com DPOC, mas apenas 12% receberam diagnóstico formal. Na prática, isso significa que milhares de pessoas sofrem com falta de ar, tosse crônica e limitações funcionais sem sequer saber a causa.

Pulmão e coração em alerta
O pulmão doente também sobrecarrega o coração. Segundo especialistas, o tabagismo aumenta em até 20% o risco de doenças cardiovasculares, como infarto e AVC. Em Manaus, cardiologistas e pneumologistas destacam que os períodos de fumaça intensa ampliam internações por insuficiência cardíaca e agravam quadros respiratórios, revelando a íntima ligação entre ar poluído, pulmão fragilizado e sobrecarga cardiovascular.
Investimentos e desafios
O Amazonas tem recebido reforços de recursos federais: R$ 846,5 milhões para Atenção Primária em 2024 e R$ 212,5 milhões do Novo PAC Saúde em 2025. O desafio é transformar esses valores em ações concretas — expandir o acesso a exames como a espirometria, fortalecer os Ambulatórios do Fumante e garantir fornecimento regular de medicamentos inalados.
Sem isso, o ciclo de internações e mortes tende a se repetir, consumindo cada vez mais recursos públicos.
Dia Mundial do Pulmão: um chamado à prevenção
O Dia Mundial do Pulmão, celebrado em 25 de setembro, foi criado em 2017 pelo Fórum das Sociedades Respiratórias Internacionais (FIRS) para chamar atenção às doenças respiratórias, que estão entre as principais causas de morte no mundo. O tema de 2025 reforça a necessidade de ar limpo e diagnóstico precoce — uma mensagem que ressoa fortemente na Amazônia, onde a poluição das queimadas impacta milhões de pessoas.

Como resume o médico Gilberto Ururahy: “Cuidar do pulmão é cuidar da vida. E cada escolha diária, do que comemos ao ar que respiramos, pode ajudar a garantir uma vida mais longa.”
Amazônia pede ar limpo
Mais que um dado em relatório, cada internação e cada óbito representam histórias interrompidas e famílias afetadas. Na região que o mundo reconhece como “pulmão do planeta”, a contradição é cruel: enquanto a floresta ajuda a regular o clima global, os amazonenses ainda sofrem com fumaça, poluição e doenças respiratórias crônicas.
O Dia Mundial do Pulmão é, portanto, um convite à reflexão e à ação: prevenir é salvar vidas, proteger famílias e garantir um futuro em que a Amazônia respire — por si e pelo mundo.