EDITORIAL

Amazônia no centro: visita de Lula a Manaus combina soberania, integração e dilemas ambientais

Pacote de anúncios busca reforçar a presença do Estado na região, mas expõe tensões entre desenvolvimento e preservação

A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Manaus, nesta terça-feira (9/9), marcou um movimento estratégico para reposicionar a Amazônia no coração da agenda nacional. Em poucas horas, o presidente inaugurou o Centro de Cooperação Policial Internacional da Amazônia (CCPI), prometeu a reconstrução da BR-319 e defendeu o avanço do licenciamento para exploração de petróleo na foz do rio Amazonas.

Esse conjunto de medidas forma um tripé político: segurança, integração e energia. Ele projeta a presença do Estado na região e envia recados para diferentes públicos — das populações locais ao mercado internacional. Mas também abre espaço para dilemas que precisam ser enfrentados com responsabilidade.

Segurança e soberania

O CCPI Amazônia, instalado em Manaus com investimento de R$ 36,7 milhões do Fundo Amazônia, é a resposta brasileira à escalada da criminalidade transnacional. Ao lado do presidente da Colômbia, Gustavo Petro, Lula afirmou que os países amazônicos “não precisam de intervenções estrangeiras” para enfrentar crimes como tráfico de drogas, armas e o garimpo ilegal.

A fala reforça a soberania regional e busca consolidar a Amazônia como território de cooperação sul-americana, sem dependência de agendas externas. O centro, apoiado por organismos como Interpol e Ameripol, terá papel crucial no combate a redes criminosas que fragilizam a floresta e as comunidades.

A estrada e seus paradoxos

No campo da logística, Lula recolocou a BR-319 no radar. A rodovia que liga Manaus a Porto Velho é vista por muitos como vital para reduzir o isolamento da região, sobretudo em períodos de seca que paralisam a navegação fluvial.

Ao reafirmar que a obra será feita “com responsabilidade”, Lula tenta equilibrar expectativas. Ambientalistas alertam que a pavimentação pode multiplicar taxas de desmatamento, enquanto empresários e políticos regionais defendem que a rodovia é essencial para reduzir custos e estimular o desenvolvimento.

Petróleo na foz: promessa e incerteza

O tema mais sensível foi a defesa da exploração de petróleo na foz do Amazonas. Lula considera que o teste realizado pela Petrobras já comprova viabilidade técnica e insiste que a exploração só deve ocorrer “com responsabilidade”.

O licenciamento segue sob análise do Ibama, que mantém cautela diante dos riscos a ecossistemas marinhos sensíveis. Ambientalistas e organizações indígenas denunciam contradições entre a aposta em combustíveis fósseis e a agenda de transição energética defendida pelo Brasil no exterior. Já setores políticos e econômicos da região veem a exploração como oportunidade de geração de empregos e arrecadação.

O desafio da conciliação

De Manaus, Lula saiu com um pacote de anúncios robusto e recados fortes: soberania contra intervenções externas, integração logística e aposta em protagonismo energético. Mas a visita também expôs os dilemas da Amazônia contemporânea: como crescer sem repetir erros do passado e como conciliar compromissos climáticos com demandas sociais e econômicas urgentes.

O desafio não é menor: transformar esses anúncios em políticas de longo prazo, que fortaleçam a Amazônia sem abrir caminho para retrocessos ambientais. Mais do que inaugurações e promessas, o que está em jogo é a construção de um modelo de desenvolvimento capaz de assegurar tanto a dignidade de seus 30 milhões de habitantes quanto a preservação da maior floresta tropical do planeta.

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