Curupira, escolhido mascote da COP30, carrega a força simbólica da Amazônia na defesa do planeta
Figura do folclore amazônico une tradição e resistência em um momento político decisivo para a floresta e seus povos
Por Dora Tupinambá (*)
A escolha do Curupira como mascote oficial da COP30, que acontecerá em 2025, em Belém do Pará, não é apenas uma homenagem ao folclore brasileiro. Para quem nasce e vive na Amazônia, como eu, essa decisão carrega um peso simbólico e político que vai muito além da estética. O Curupira é, há séculos, guardião da floresta. É uma entidade encantada que protege os animais, confunde invasores com os pés virados para trás e pune com rigor quem tenta ferir o equilíbrio da natureza.
Ao escolhê-lo como símbolo da maior conferência climática do planeta, o Brasil envia ao mundo um recado claro: a Amazônia tem seus próprios protetores, mitos e narrativas, e eles agora caminham lado a lado com a ciência, a política e os povos da floresta.
Esse gesto também é profundamente político. Em tempos de retrocessos ambientais, desmatamento e discursos que tentam deslegitimar a presença dos povos indígenas e ribeirinhos em seus próprios territórios, trazer o Curupira para o centro do debate global é resgatar o protagonismo da cultura amazônica. É dizer que não estamos aqui apenas para sermos defendidos — nós também sabemos defender. A floresta tem voz, corpo e alma. E ela fala na linguagem dos encantados.
O Curupira é símbolo de resistência e vigilância. Ao contrário de mascotes decorativos, ele é um guardião. Sua imagem remete à ancestralidade, mas também à urgência: o planeta está correndo contra o tempo, e a floresta tem pressa. A Amazônia é o epicentro dessa discussão, e nós, amazônidas, não somos coadjuvantes. Somos parte da solução.
Escolher o Curupira é também uma resposta à política global que, muitas vezes, olha para a floresta como espaço a ser explorado, e não como território sagrado. É um lembrete de que desenvolvimento sustentável não se faz ignorando os saberes ancestrais, mas ouvindo quem conhece cada cheiro, cada som e cada perigo da mata.
Para nós, que crescemos ouvindo histórias dos nossos avós sobre o Curupira assobiando no fundo da mata, ver essa figura se tornar símbolo da COP30 é emocionante. É como se, enfim, o mundo reconhecesse que a Amazônia não precisa ser traduzida — ela precisa ser respeitada.
Que o Curupira, com seus pés invertidos e sua missão ancestral, nos guie nessa travessia em defesa da vida. Porque proteger a floresta é proteger o futuro — e o futuro começa agora.
(*) Colaboradora do Valor Amazônico